Pense aí numa terra tão fértil, mas tão fértil, que tudo o que há de bom dela aflora… esse é o Cariri!
Nesse chão, tem de ruma boa gente, cultura, tradição, arte e natureza. É tanta riqueza junta que pode ser considerado patrimônio da humanidade. Inclusive, já tem tempo que essa batalha é travada, reconhecer a Chapada do Araripe como tal. Mas, enquanto isso, a gente segue festejando esse tesouro em um evento que já é de lei: a Mostra Sesc Cariri de Culturas, realizada pelo Sistema Fecomércio Ceará, por meio do Sesc e do Senac.
Mestre Antônio Luiz nasceu em Potengi, região do Cariri, em 1957, cidade onde mora até hoje. Referência como Mestre da Cultura, é idealizador e brincante do Reisado de Máscaras, no Sítio Sassaré. Sua casa, onde mora há mais de 40 anos, tornou-se um lugar muito importante para a memória do nosso povo.
Enfeitando as paredes da sala de visitas, estão fotografias, instrumentos musicais e máscaras que fazem parte da vida de Antônio Luiz desde 1975, quando entrou para o reisado de caretas. Antônio Luiz sabe, como ninguém, as sequências da brincadeira e da arte de esculpir as máscaras, pois preserva na memória, há quatro décadas, o que aprendeu com os mestres que brincavam antes dele.
A história do Mestre Françuili começa das brincadeiras com as outras crianças no alto de um pé de Juá. Na volta do caminho da roça, ele observava os pássaros voando e já tinha uma fascinação por tudo que não encostasse os pés no chão. Seu sonho ganhou forma quando um avião cruzou o céu da roça do seu pai, em meados de 1948. A partir dali, o garoto abriu as asas da imaginação e criou aviões, foguetes, helicópteros e até disco voador.
A técnica de utilizar flandres e zinco se tornou obra exposta no Museu da Criança, em Salvador, Bahia, e em mais dois museus paulistas. Além dos brinquedos, ele constrói utensílios e equipamentos, como fornos e pás, também adaptou baldes para coletar água nas estreitas cacimbas do sertão. Inventou tubos de armazenar legumes e até hoje sabe fazer os candeeiros que antigamente flamejavam para alumiar as casas.
Localizada no meio da caatinga, em Potengi, na Fazenda Belo Horizonte, mais conhecida como Sítio Pau Preto, hoje, “A Casinha” se transformou em espaço de observação e de fotografia de aves de Jefferson Bob. Uma herança que passa por gerações desde Seu Abraão, bisavó, Dona Zizi, avó, e Mário Filho, pai de Bob, como é chamado na região. Desde criança teve sua vida conectada com o sítio, tornando-se biólogo e conhecedor da avifauna.
À medida que foi crescendo, Bob percebeu que, além dele, outras pessoas também faziam o mesmo e então passou a exercer a atividade de guia de observação de aves em 2013.
O amor pela natureza transformou o Sítio Pau Preto em referência como área exclusiva de para a observação de aves, pioneiro no Nordeste. Atualmente, conta com 212 espécies de aves registradas no “E-Bird” e recebe visitas de todas as partes do mundo, oferecendo serviço de hospedagem e ponto de apoio para a atividade.
Dos pés dos vaqueiros ao desfile fashion, muita coisa mudou na história do couro e da cidade de Nova Olinda depois que Espedito Seleiro decidiu fazer um baú para sua mãe. A história começa em Nova Russas, município situado no oeste do estado do Ceará, onde o pai fazia sapatos para vaqueiros, tropeiros e ciganos. Espedito, ainda aprendiz, pegava o resto dos couros usados nas peças e fazia as suas.
Um conhecimento que já perpassa cinco gerações. Ao lado de uma equipe de aproximadamente 20 pessoas, Seleiro conta que, se por acaso morresse amanhã, seus cinco filhos continuariam a tradição de manuseio do couro herdada pela família. Seleiro fez peças para filmes, novelas e desfiles, mas como ele explica, não se orgulha tanto disso, pois “qualquer pessoa para mim é importante”. A memória do Mestre Espedito Seleiro está hoje cotidianamente na oficina de trabalho dele e no Museu do Couro.
Aos 68 anos, as mãos da Mestra apresentam as marcas de dois caminhos: da roça e do artesanato. Foi observando a irmã mais velha fiar e tear redes que Mestra Dinha começou a aprender sobre o manuseio de tecidos. Ela tinha 12 anos quando fez a primeira rede e, para ela, o aprendizado era um suspiro para além da rotina de trabalho.
Do bairro Vila Alta em Nova Olinda, suas redes são grandes e se destacam por apresentarem maior resistência e por trazerem os pequenos gestos sábios da Mestra. Uma rede por semana, um ponto por dia e assim por diante. O desejo de ensinar perpassa a fala. É nesse ponto que ela destaca a principal utilidade do museu: contar a história das mulheres que quiseram ir além da roça.
Situado no bairro Seminário, o Museu Casa do Mestre Raimundo Aniceto é o primeiro museu orgânico do Crato, homenageando a trajetória da Banda Cabaçal dos Irmãos Aniceto na cultura popular, com a proposta de manter viva a dança do povo Kariri, através da tradição herdada da música.
Instrumentos feitos à mão pelos próprios integrantes e ritmo guiado pelos pés. Aos 12 anos, o Mestre Raimundo começou a brincar na dança que envolve a observação da natureza, instrumentos e passos influenciados pela cultura dos índios Kariris, os primeiros habitantes da região. Hoje, são seis homens no grupo, todos com laços sanguíneos e culturais, estando na 4ª geração, composta pelos filhos dos que já faleceram.
O amor pela cultura popular move a vida da Mestra Zulene Galdino. Com alma brincante, é figura conhecida e respeitada na região, seja por participar ativamente de grupos de tradições ou simplesmente por ensinar a magia das danças populares para a nova geração. Entre quadrilhas, maneiro pau, lapinhas e cintura fina, ela é uma guardiã da tradição e não se vê fazendo outra coisa na vida.
Dividida entre as coreografias, a confecção dos trajes e o toque de instrumentos, Zulene Galdino abre sua casa para tantos saberes e histórias. Em seu quintal, no Granjeiro, localizado no Crato, as crianças brincam, aprendem a ler e participam de terreiradas. A Mestra é também umas das mais conhecidas e requisitadas rezadeiras da região. Para receber a sua bênção, vem gente de tudo que é lugar.
O primeiro museu orgânico a ser inaugurado em Juazeiro do Norte, no bairro João Cabral, é o do Mestre Nena. Em sua própria casa, o espaço é, antes de tudo, um ponto de escuta por recontar a história da cultura popular regional. É ali que as armas do cangaço se fizeram arte e levam ao mundo a cultura da paz.
Foi em maio de 1963, aos 12 anos, que começou a brincar na tradição. Aprendeu a dançar com Mestre Moisés Ricardo e, com o passar do tempo, absorvendo a cultura de outros mestres. Foi no grupo Bacamarteiros, do Beato Zé Lourenço, que Nena se encantou com a tradição do bacamarte, presente até hoje na sua trajetória artística.
De 22 a 25 de agosto, a região do Cariri cearense recebe a efervescência da Mostra Sesc Cariri de Culturas. Viva o nosso patrimônio!
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