Uma reflexão acerca da identidade humana através de múltiplas linguagens artísticas é a proposta das três exposições atualmente em cartaz no Centro Cultural Banco do Nordeste. Fotografia, colagem, grafite, lambe-lambe (vertente da arte de rua que utiliza cartazes), pintura, teatro e xilogravura se integram na 17ª edição da Mostra Sesc Cariri de Culturas com os trabalhos “Eu à Beira do Precipício”, “Cotejo” e “Encontro de Intervenção Urbana”. As exposições tiveram início ontem (13) e seguem ao longo do evento.
No “Encontro de Intervenção Urbana” a voz das ruas tem como espaço de eco a galeria de arte. A ação reúne criadores de arte urbana – autores de intervenções que poderão ser vistas ao longo da Mostra, pelas cidades do Cariri – no quinto andar do Centro Cultural do BNB. Diversos sotaques e culturas se mesclam em uma fusão de técnicas e expressões de diferentes regiões do País, através de nomes como Rafael Boneco (MG), Talita Oliveira (AC), Cirulo (SE), Sandro Ka (RS), Voyeur Gráfico (CE), Galeria Sem Licença (PR) e Lino Fly (CE).
Uma dessas misturas se consolida através da parceria entre os artistas Rafael Boneco e Cirulo. Com pintura e grafite, eles construíram um mural com a temática da cultura regional nordestina. “A bagagem desse encontro, para mim, é a parte mais interessante. No campo da arte não há isso do domínio específico sobre o que você está fazendo, sempre você tem pessoas à sua volta que vão agregar ao seu trabalho, sempre vai haver um enriquecimento quando se vê outro artista fazendo o trabalho dele”, afirma Rafael Boneco.
Para o artista visual, a experiência de produzir dentro de uma galeria de arte proporciona novas percepções à arte do grafite. “Aqui a gente está tratando de outro segmento, não está somente pensando no público da rua, mas com outro tipo de colocação”, destaca Rafael Boneco. Já Cirulo comenta a efemeridade do suporte, mesmo em ambientes controlados de intempéries. “Lá em Aracaju, pinto em muitos locais que estão prestes a serem demolidos para virar estacionamento. Em muitas cidades isso está acontecendo e, para mim, é um exercício de quebra de ego. Incomodo-me mais quando apagam meu trabalho para colocar propaganda do que mesmo a ação do tempo. Até esse trabalho que faço aqui, hoje, dentro de um ambiente fechado, se eu vier daqui a um mês e ele não estiver mais, devo compreender que faz parte da dinâmica. Isso é que faz, pra mim, ser grafite: esse desgaste”, aponta.
Espaços e posturas sociais – O questionamento acerca do território de cada um é o mote da exposição inédita “Cotejo”, do artista visual cearense Célio Celestino. Em 28 imagens trabalhadas na técnica da colagem o autor traz ao visitante a argumentação acerca dos espaços sociais e seus preconceitos. “A mostra tem duas séries: a ‘Denominador Comum’, com uma parte mais indígena e a ‘Sangue no Olho’, que é mais afro. Esses dois povos pode-se dizer que são menos favorecidos socialmente, então a ideia de colocar um índio em um ambiente super chique é pra mostrar um pouco esse contraste e se perguntar ‘Será se tem território certo pra gente? Será se essas cercas que existem podem ser ultrapassadas?’”, reflete Celestino.
Uma revisitação aos álbuns de família foi a pesquisa inicial do Coletivo ]duas[, composto pela atriz Heloísa Marina e pela artista visual Maíra Ishida. Investigar a postura da mulher na sociedade, ao longo de quase um século de fotografias, foi o ponto de partida para a mostra que conta com 30 imagens de momentos cotidianos de parentes e amigos das duas intérpretes. “Na verdade, começou em uma viagem de intercâmbio de trabalho nos EUA. A gente começou a se perguntar acerca da nossa identidade, o que é ser brasileira, mulher, de onde a gente vinha. Daí decidimos juntar as duas linguagens, da fotografia e do teatro”, afirma Maíra.
Seguindo a estética original das fotografias de época, as artistas recriam figurino, locações e poses eternizadas, em sua maioria, de suas mães. O nome da mostra veio, inclusive, de um desses momentos imagéticos, um registro feito à beira de um precipício e dedicado por uma amiga. Olhares, gestos e posturas que mostram muito mais do que uma cena, mas um posicionamento da mulher em seu tempo. “Uma das questões que a gente viu é como que a mulher vai se colocando nas fotos, como ela encara a câmera, como que isso vai mudando ao longo do tempo. Em algumas fotos bem antigas algumas delas já tinham uma postura bem provocativa, mais aberta. Então a questão é bem essa, de como que a mulher se coloca em diferentes tempos ou como diferentes mulheres se colocam no mesmo tempo”, avalia Heloísa.
SERVIÇO
Local: Centro Cultural Banco do Nordeste (Rua São Pedro, 337 – Centro – Juazeiro do Norte)
Período: Até 17/11
Por Cristiane Pimentel