Muitos artistas imprimem em suas obras traços de sua própria vida, entre dúvidas, gostos, inquietudes, desejos, fragilidades e confissões, em um verdadeiro e sincero mergulho dentro de si. Mergulho este, no entanto, que transborda para os outros, para o mundo, pois somos verdadeiramente impactados por trabalhos artísticos que carregam beleza e memória. Talvez este aspecto, quase que autobiográfico, seja uma das características mais marcantes de José Leonilson, cearense que transitou, como ninguém, entre pintura, desenho, bordado, escultura e instalação, conquistando reconhecimento de público e de crítica no Brasil e em diversos outros países.
Leonilson nasceu em Fortaleza no dia primeiro de março de 1957. Aos quatro anos, mudou-se com a família para São Paulo, onde começou a despertar o interesse pelo mundo das artes, ainda como uma brincadeira de menino, mas sempre com um olhar sensível em relação ao mundo ao ser redor. De 1977 a 1980, cursou educação artística na prestigiada Fundação Armando Álvares Penteado (FAAP), quando teve a oportunidade de aprender com grandes nomes do circuito das artes plásticas da época, como Julio Plaza, Nelson Leirner e Regina Silveira.
Foi na FAAP onde Leonilson começou a desenvolver efetivamente suas habilidades, que, em pouco tempo, tornaram-se conhecidas e admiradas por seus colegas, professores e, posteriormente, o público. Considerado um aluno curioso e de ideias próprias, o cearense foi se destacando pelas formas orgânicas que conduzia seus desenhos e pinturas, inicialmente desenvolvidos em suportes como telas e lona. A primeira exposição coletiva foi em 1980, com apenas 23 anos, no Museu de Arte Contemporânea da USP. Seu talento, entretanto, ganhou o mundo. O artista já expôs, por exemplo, na Espanha, Alemanha, França, Suécia, Argentina e Venezuela, sempre colecionando elogios e credibilidade entre os nomes que circulavam no meio artístico.
“Leonilson conseguiu transportar para as obras as suas emoções, a partir do uso de diversos símbolos recorrentes, como a ponte, a escada e o espelho. Seu trabalho também é marcado pela experimentação de materiais e técnicas e pela expressividade, inclusive com várias referências da cultura nordestina. Na Praia de Iracema, os visitantes podem conferir, por exemplo, a obra ‘A Torre da Praia’, mais conhecida como caixa d’água dos peixinhos”, destaca Rafaela Lopes, analista de cultura do Sesc Fortaleza.
Já em 1989, Leonilson começou a trabalhar com costuras e bordados, tornando-se uma constante em sua trajetória a partir de então. Foi, inclusive, um caminho natural e até familiar, uma vez que a mãe era uma ótima bordadeira e seu pai, um comerciante de tecidos. Para muitos artistas, curadores e demais especialistas, a fase mais confessional e subjetiva de Leonilson foi justamente quando ele passou a utilizar o bordado e a costura, além do uso de palavras e de desenhos bem pequenos, como parte principal de seu processo criativo.
“Leonilson era bastante tímido, muito na dele. E talvez seja até por isso que essas inquietações sem mostram tão evidentes no seu trabalho. Todo esse sentimento foi traduzido através de sua obra, e isso para um artista é maravilhoso”, explica o também artista plástico Mano Alencar.
Esse período de experimentações com bordados, inclusive, foi bastante marcante em sua obra. Em 1991, o artista descobriu ter o vírus HIV, fato que passou ser uma constante em seu trabalho. Considerado um autorretrato, a obra “El Puerto” (1992), traz um tecido semelhante a uma roupa de hospital, com informações sobre sua idade, altura e peso bordados, emoldurada em um espelho. Também em 1992, na série de sete desenhos intitulada “O Perigoso”, Leonilson explora elementos como uma gota de sangue, contaminado, crucifixos e demais elementos cristãos como forma de abordar a doença e a ideia da morte.
Leonilson morreu em 1993, com apenas 36 anos. Sua trajetória, contudo, foi intensa, única e permanece presente e preservada para quem quiser conhecer e/ou apreciar, a exemplo do sobrado da família, localizado no bairro Vila Mariana, em São Paulo, onde o público pode conferir as obras, o seu legado e a sua memória. “Leonilson segue sendo um artista de total relevância para o Brasil, sobretudo para o nosso Estado, já que ele levou um pouco de nós todos para fora. Isso é um motivo de muito orgulho”, pontua Mano Alencar.
Acima de tudo, Leonilson é mais um cearense que mostrou – e mostra – para o mundo o que a nossa arte tem de melhor. E, além do artista plástico, o nosso Estado tem tantos outros nomes, igualmente talentosos, que tanto orgulham a nossa gente. Orgulho este que o Sesc Ceará, braço social do Sistema Fecomércio, sente ao ver um artista local ganhar brilhar, fazer e acontecer. E é nessa perspectiva que, em 2020, a Mostra Sesc de Culturas vem aí. Com uma programação 100% digital, o encontro será também 100% made in Ceará, com uma programação para que todos, em qualquer lugar, conheçam os talentos da terrinha. Aguarde!